sábado, 9 de fevereiro de 2008

O crime do advogado do oitavo andar

Era quinta-feira. Quinze minutos passados da hora da entrada, quando Anacrezia desmontou no elevador. Estava especialmente pálida. Olhos vermelhos, ronronando, fungando e chupando a bombinha. Souza, não agüentou:
- Anacrezia, se o sindico te pega com esse gato escondido embaixo do jaleco, te da um cartão vermelho. Hehehe.
Anacrezia estava cabisbaixa e assim ficou, desceu, deu bom dia, nem levantou o olhar e foi trabalhar.
Já era mais ou menos onze horas da manha. Anacrezia estava sentada no banheiro, olhando a água no chão, meio que esperando o piso secar-se sozinho...

17/01/2007

O assalto

Anacrezia, como todos os dias, chegava em cima da hora, corria para alcançar a porta do elevador, sem ao menos, poder dizer Bom dia ao Souza, tamanha a falta de ar.
- Qualquer dia desses, vai receber cartão vermelho, onde já se viu, entrar com esse gato escondido. Hehehe. Murmurava Souza, enquanto para seu umbigo repetia, “essa não escalo pra nada, nem pra gandula”.
Anacrezia não dava muita atenção ao que lhe diziam, talvez já estivesse acostumada com as piadinhas. Em seu mau humor habitual, rompeu a porta do quarto andar onde ficava a copa...

17/01/2007

Revelação

As paredes eram frias, de um azul acinzentado, o salão muito grande e pouco acolhedor, era dividido ao meio, o balcão seguia ao longo como uma imensa muralha que isolava os humanos, deles. Naquela hora a repartição ainda não abrira ao público. Aos poucos, um a um, iam tomando seu lugar, em mesas gélidas e cheias de burocracia. A porta abriu, subitamente aquela figura exótica invadiu o salão principal. A roupa já surrada era bem maior que seu tamanho, trazia um alfinete, desses antigos, do tempo em que as fraudas eram de pano, apertando-lhe o cós, enquanto as pernas da calça, esfoladas e encardidas, arrastavam pelo chão...

21/11/2006

Confissão

Escrevo porque tenho medo que minhas palavras se percam, e eu não as reconheça em outras vozes.
Escrevo porque tenho medo de partir de repente sem ter sido notada.
Escrevo porque tenho medo de falar sem ser ouvida, de ouvirem o que falo, de me assustar com as palavras que criam pernas e ganham vida depois de ditas.
Escrevo porque sou covarde demais para falar.
Escrevo porque tenho medo de ir sem ter feito nada.

Búzios, 22/09/2007